quinta-feira, 16 de abril de 2015

Sobre a novela das nove, hipocrisia e intolerância

No ano passado, fiquei amiga de um garoto, e cheguei a sair com ele algumas vezes. Sair só como amigos mesmo, porque tínhamos muita coisa em comum: de filmes de terror à temática geek. No entanto, apesar da companhia legal, algumas coisas nele me incomodavam. Eu logo percebi que ele tinha um certo interesse em mim e sempre procurei demonstrar, mas sem magoá-lo, que eu não correspondia esse interesse. No entanto, ele me mandava mensagens toda hora, por todos os meios possíveis. Sabe quando a pessoa se torna obsessiva a ponto de não ter absolutamente nenhum assunto, mas mesmo assim fica chamando e insistindo, ignorando os seus sinais de "não posso/não quero falar no momento"? Pois é. Só isso já foi o suficiente para esfriar minha vontade de conversar com ele, e o distanciamento também me fez ver coisas que ele meio que mascarava quando estava comigo: além do machismo bem disfarçado, homofobia. Aquela de querer que todos os homossexuais sejam exterminados a tiros, basicamente.



Se eu já estava fria antes, aquele comportamento dele me fez congelar de vez. Simplesmente parei de responder as mensagens. Não me orgulho nem um pouco disso, mas a verdade é que eu não sou muito boa em dar foras (mas é claro que eu faço isso do jeito correto, quando de fato tenho algum envolvimento com a pessoa). Como perdi por completo a vontade de sair com ele pra qualquer lugar que fosse, eu cortava toda vez que ele me chamava, dizendo que não tinha tempo ou mesmo que não estava a fim (pelo menos eu não mentia). Ele foi parando aos poucos, embora ainda chame, de vez em quando. Continuo ignorando, e até poucos dias atrás eu ainda me sentia um pouco mal por isso. Até que, em uma mesa com cerveja e amigos no último fim de semana, descobri um podre dele - um podre muito feio. Resumindo: um amigo meu tem uma ex-colega de escola que é garota de programa, e não tem uma vida nem um pouco fácil. Eu nem conheço a menina (aliás, nem sei exatamente quem ela é), mas sei da história dela através desse amigo, que me contou sem citar nomes. Tenho um pouco de pena dela e nunca a julguei, porque já passei da fase de julgar as pessoas. E, bom... meu amigo me contou que esse cara insistente com quem cortei ligações, também conhecia a menina, e havia descoberto tudo sobre ela. E andava chantageando ela. Para fazer sexo com ele, em troca de seu silêncio.

Quando eu soube disso, meu asco foi tão grande que meu sentimento de culpa passou na mesma hora, e imediatamente gritei : "Ainda bem que me afastei daquele idiota!". O porquê de eu estar contando isso tudo? Bom, porque é impossível não dar lag no cérebro, ao colocar esse atitude asquerosa dele ao lado de sua homofobia. Porque não entra na minha cabeça como um cara que chantageia mulheres (e ele é racker, o que torna tudo mais assustador ainda) para forçá-las ao sexo, pode encher a boca para dizer que gays são imorais.



Não estou dizendo que todo homofóbico age assim, até porque não sou adivinha e não tenho como saber tudo sobre a vida das pessoas. Mas é justamente essa hipocrisia que dá raiva. Recapitulem comigo: quantos caras que você conhece dizem que ser gay é falta de vergonha na cara, mas traem a esposa como se isso fosse lindo? Quantas mulheres que você conhece acham um absurdo ver um casal gay se beijando, mas dão em cima do boy da amiga sem o menor peso na consciência?Quantos pais se indignam porque não querem que o filho veja um casal gay passeando de mãos dadas, mas se xingam dos nomes mais baixos, sem se importar se a criança está ouvindo ou não?Quantas pessoas que você conhecem ficam incomodadíssimas com o amor, ao mesmo tempo em que pregam o ódio e a sacanagem com o semelhante, o tempo todo? É parecido com uma frase que eu repito em toda sexta-feira santa: as pessoas matam, roubam, invejam e traem o ano todo, mas na sexta-feira santa não comem carne porque "é pecado".

A novela Babilônia (Globo), que ao que parece, está tendo problemas com a audiência e vem sofrendo boicote, tem muitos problemas. Pouco a assisti, mas nesse pouco já vi mãe e filha trocando tapas, "amiga" invejosa imitando doentiamente seu objeto de cobiça, marido e mulher extremamente infiéis um ao outro, planos de vingança assustadores, abuso de poder para fazer sexo com subalterno, um cara aliciando mulheres à prostituição (e explorando a própria namorada apaixonada)... isso além dos clichês de sempre, como a mocinha disputando um homem com uma "rival", e cenas suuuper machistas no primeiro capítulo, que ninguém mais se lembra, mas não me saíram da cabeça: um cara casado convencendo a mocinha a acompanhá-lo porque "uma moça não deve andar tão tarde sozinha na rua", e depois, com eles já namorando, ela se recusando a transar porque "não é dessas". E em uma novela com esse monte de porcarias, o que mais incomoda a "família tradicional brasileira" e todo esse povo cristão e de bem, é isso:


Amor. O amor de duas senhoras que estão juntas a quarenta anos, e adotaram uma criança. Que são verdadeiras. Que são corajosas. Que são guerreiras. Como os muitos homossexuais por aí, que convivem diariamente com o preconceito e a intolerância, que os excluem de empregos, de círculos de amizade, de suas famílias, da sociedade em geral. Que os impede de manifestar um carinho dos mais banais a quem amam, porque isso pode ofender os "cidadãos de bem"- sim, esses que pregam o ódio. E convivem também com o risco de serem agredidos/espancados/mortos por gente que segue a mesma linha de pensamento desses "cidadãos de bem".

Toda essa "caça às bruxas" à novela - como disse a genial Fernanda Montenegro (ela já concorreu ao Oscar, e você?) -, só mostra o quanto os valores dos brasileiros são invertidos, e o tanto de coisa cagada que a gente ainda tem que mudar. Rackers misóginos continuarão assediando mulheres, enquanto houver gente achando isso normal e engraçado. E homossexuais continuarão sofrendo perseguição e morrendo, enquanto a "família tradicional brasileira" continuar fazendo um escândalo por conta de um simples beijo.


6 comentários:

  1. É isso aí, tá tudo errado nesse mundo. pq, né, não é só no Brasil que isso acontece, não. infelizmente, não é só no Brasil...Mas voltando ao caso desse filho da fruta que tava te perseguindo, tu fez bem em simplesmente se distanciar. Minha irmã já me narrou um caso parecido, de um cara insistente atrás dela, mesmo ela dizendo "não", assim mesmo, na cara dura. e o cara se irritou e começou a insultá-la, falou um monte de asneira, e não sei quantas semanas depois, ele voltou enchendo o saco dela, querendo que ela fosse atrás dele. isso é doença. tem muito cara doente, terrivelmente carente de afeto, amor, amizade...de tudo. :/ e todo cuidado é pouco!

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    1. No meu caso não chegou ao ponto que chegou com a sua irmã, graças à Deusa, porque tenho uma intuição fodalhástica com esse tipo de coisa. Não é a primeira vez que me afasto de um cara, e logo depois descubro que ele era um típico "Homenzinho de Merda". Fiquei bem chocada, quando soube o que ele tá fazendo com a menina. Imagina, quanto tempo ia levar pra ele tentar fazer algo parecido comigo? Vade retrum! o.O
      E como a sua irmã fez, pra se livrar desse cara?
      Beijinho. :*

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    2. pois é, eu nao sei bem toda a história, mas ela me dizia que ele ficou meses ligando pra ela, e mandando mensagens. Mas ela não respondia, até que ele de certo se cansou. mas fiquei realmente preocupada com essa menina aí!!! :S alguém tinha que dar uma "pára-te quieto" nesse cara aí. ainda bem que tu te antenou antes sobre esse tipinho.

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    3. Pois é, pensar no que essa menina passa me incomoda muito, também. Se eu a conhecesse, daria apoio. A merda é que não tem o que fazer, sem acabar expondo a guria. :/

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  2. Eu juro que não entendo como as pessoas podem se sentir ofendida pela vida dos outros, pelos valores do outro... Onde já se viu agir com violência física ou verbal por causa da escolha do OUTRO?
    História tensa da sua colega, queria não ler histórias assim nunca mais :/
    Conheci seu blog por causa desse post e estou adorando, já comecei a seguir.

    Grande abraço!
    Tribo Alternativa

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    1. É a pergunta que faço todos os dias, Carolina: que raio de diferença faz na minha vida, a sexualidade dos outros?Por que alguém diferente de mim teria que me ofender tanto? E que porcaria de família seria a minha, se o amor de pessoas que não tem nada a ver com ela pudesse destruí-la? Não tem lógica.
      Fico imensamente feliz por você ter gostado do blog. Estou indo já conhecer o seu. =)
      Beijinhos.

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